Nem as linhas verdes formadas pelo laser o agradam. O fantástico efeito das luzes em néon, que acentuava o branco e o fazia ver nas pessoas um brilho oculto e revelador, já não o divertia como outrora. A decoração lésbica e as grades que lembravam um ringue de luta livre não mereceram mais que dois segundos de contemplação. Assim começou a última noite de Jeremias.
Apática. Num ostracismo quase nostálgico, a cerveja arranhava a garganta e irritava o estômago. Não que não fosse afeito aos prazeres do álcool. Pelo contrário. Mas aquela era a última noite e, longe de configurar uma festiva despedida, moldou-se em um turbilhão psico-emocional que a prodigiosa poção fermentada só faria catalisar.
Jeremias sabia. Seria a última noite, indiscutivelmente. Em suas conversas transcendentais com a Lua, já havia sido prevenido. Embora ultimamente desconsiderasse os conselhos e as opiniões da velha companheira, teve que baixar o olhar e refletir diante da imensidão das suas certezas de matriarca empedernida. Assim sendo, arrumou-se para tal com a crença cega das mentiras que, de tão repetidas, acabam por virar verdades.
As pessoas felizes o irritavam. Dançavam como se disso dependesse as suas vidas. Bebiam como se disso tirassem algum prazer. Sorriam como se assim comunicassem sem dizer. A pequenez das vidas ao redor parecia carimbar em sua pele o aval das últimas noites. Mecanicamente, qual carro que se afoga em gasolina mesmo sem gostar do cheiro e unha que bóia em esmalte mesmo sem sentir a cor, Jeremias enchia o copo de cerveja. Antes de tomar, já sucumbia ao gosto acre e à ânsia de vômito. Mas continuava entornando. No quarto copo obrigou-se a ir ao banheiro e encarar, mais que o fedor e o nojo, seu próprio reflexo no espelho. E como o irritava o ar sabichão e acusador que tinha seu reflexo! Preferia muito mais sua sombra, que era muda e contentava-se em encará-lo com a não-expressão típica das sombras. Um recato que os reflexos de espelhos de bar ainda desconhecem.
Acompanhado da sombra, que fazia um esforço nebuloso para seguí-lo por entre o rastro dos néons e dos jatos coloridos que lançavam fótons em riste, Jeremias pensava em quão privilegiado era, pois apenas ele sabia que aquela era a última noite. Apenas ele poderia prever que o nada viria depois. Que os laseres afiariam-se como facas e decepariam todos os sorrisos dançantes e que as lésbicas sairiam das paredes para engolir a pista com um apetite ferino. Que o chão xadrez ficaria tão movediço quanto areia e dragaria os pés saracoteantes aos domínios inertes daqueles que nunca dançam.
E, por saber, tudo lhe passou a olho nu sem as menores conseqüências. Os laseres sequer raspavam sua cabeça. As lésbicas o evitavam com uma expressão quase amedrontada e o chão sob seus pés era tão firme quanto a certeza de que a última noite da humanidade era seu primeiro dia de glória.
Apática. Num ostracismo quase nostálgico, a cerveja arranhava a garganta e irritava o estômago. Não que não fosse afeito aos prazeres do álcool. Pelo contrário. Mas aquela era a última noite e, longe de configurar uma festiva despedida, moldou-se em um turbilhão psico-emocional que a prodigiosa poção fermentada só faria catalisar.
Jeremias sabia. Seria a última noite, indiscutivelmente. Em suas conversas transcendentais com a Lua, já havia sido prevenido. Embora ultimamente desconsiderasse os conselhos e as opiniões da velha companheira, teve que baixar o olhar e refletir diante da imensidão das suas certezas de matriarca empedernida. Assim sendo, arrumou-se para tal com a crença cega das mentiras que, de tão repetidas, acabam por virar verdades.
As pessoas felizes o irritavam. Dançavam como se disso dependesse as suas vidas. Bebiam como se disso tirassem algum prazer. Sorriam como se assim comunicassem sem dizer. A pequenez das vidas ao redor parecia carimbar em sua pele o aval das últimas noites. Mecanicamente, qual carro que se afoga em gasolina mesmo sem gostar do cheiro e unha que bóia em esmalte mesmo sem sentir a cor, Jeremias enchia o copo de cerveja. Antes de tomar, já sucumbia ao gosto acre e à ânsia de vômito. Mas continuava entornando. No quarto copo obrigou-se a ir ao banheiro e encarar, mais que o fedor e o nojo, seu próprio reflexo no espelho. E como o irritava o ar sabichão e acusador que tinha seu reflexo! Preferia muito mais sua sombra, que era muda e contentava-se em encará-lo com a não-expressão típica das sombras. Um recato que os reflexos de espelhos de bar ainda desconhecem.
Acompanhado da sombra, que fazia um esforço nebuloso para seguí-lo por entre o rastro dos néons e dos jatos coloridos que lançavam fótons em riste, Jeremias pensava em quão privilegiado era, pois apenas ele sabia que aquela era a última noite. Apenas ele poderia prever que o nada viria depois. Que os laseres afiariam-se como facas e decepariam todos os sorrisos dançantes e que as lésbicas sairiam das paredes para engolir a pista com um apetite ferino. Que o chão xadrez ficaria tão movediço quanto areia e dragaria os pés saracoteantes aos domínios inertes daqueles que nunca dançam.
E, por saber, tudo lhe passou a olho nu sem as menores conseqüências. Os laseres sequer raspavam sua cabeça. As lésbicas o evitavam com uma expressão quase amedrontada e o chão sob seus pés era tão firme quanto a certeza de que a última noite da humanidade era seu primeiro dia de glória.
*(tentativa de) conto para a cadeira de Jornalismo Literário.
6 comentários:
agora li com calma.
e nunca mais vou te emprestar contos de garcía márquez. só faltava o jeremias sair voando. hehe
Quando o mundo acabar, as lésbicas vão ser as primeiras a morrer, é isso??
Como assim, tentativa? tá ótimo, muito bom.
Já deixei reservado os sábados do meu próximo semestre pra cadeira de Jornalismo Literário \o/
*(tentativa de) conto para a cadeira de Jornalismo Literário.
Se isso é uma tentativa, fico com medo só de pensar o que seria o teu conto pra valer...
Tá mtu bom, bjos.
eu não te gosto mais...
tu não atualiza nem comenta no meu faz DOIS posts!!!
sentirás minha falta daqui a um mês e não vai adiantar chorar! :P
;)
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