domingo, 17 de fevereiro de 2008

Faltou culhão

Numa agradável conversa típica de domingo, eu e mais algumas pessoas devaneávamos sobre a cultura oriental e os benefícios que ela trazia ao povo japonês, mais especificamente. Bem, eu não participava ativamente do diálogo, minha presença física na roda era contraposta pelo jornal que eu lia sem muita emoção. Apenas escutava atentamente as opiniões expressadas. Eis que aconteceu. Num determinado momento, um certo membro do grupo começa seu brado incoerente e desprovido de qualquer fundamento. Fiquei tão perplexo que posso transcrever a fala quase na íntegra.

“Os japoneses são um povo que dá certo, hein. E digo mais, sabe qual é a minha teoria para que o Brasil também dê certo? Pega uns trinta navios e enche com nordestinos e manda tudo pro Japão. Os navios nem precisam chegar lá. A maioria pode afundar no caminho, matando esses nordestinos. Dae, então, enche outros trinta navios com japoneses e manda pro Nordeste. Vocês veriam, o país inteiro passaria a querer ser como o Nordeste.”

O responsável por tamanha ignomínia já é vacinado, tem bem mais de 18 anos e curso superior. Sabidamente em todo o nosso bando, é envolvido com drogas e metido em algumas pendengas com o tráfico local. Pois bem, a fala desse cidadão me deixou aturdido. Escondido atrás do jornal, tive ímpetos de voar em seu pescoço. Maquinei diversas respostas à altura. Nenhuma, porém, saiu da minha temerosa e acovardada boca. Eis aqui o que eu devia ter dito:

“E sabe qual é a MINHA teoria para que o Brasil dê certo? Pega todos os drogaditos e coloca em navios a caminho de algum lugar entre a Bélgica e a Holanda. Sem clientes, não haveria mais tráfico. Sem tráfico, a violência nas favelas diminuiria consideravelmente. O país gastaria menos com segurança e poderia investir mais em educação. Com mais escolas, teríamos menos presídios e por aí seguiria uma enorme lista de correções de imperfeições históricas que assolam a nação desde os mais remotos tempos. Então, fulaninho, tu devias pensar umas quinze vezes antes de colocar a culpa num nordestino que vive nas condições (climáticas, sociais e econômicas) mais adversas possíveis e que não tem tempo nem dinheiro pra ficar sustentando o perverso ciclo social que pulveriza quaisquer ilusões de “acerto” para esse país.”

Não dito o parágrafo acima transcrito, não dito nada, retirei-me do recinto com o jornal quase amassado entre os dedos. Com mais raiva de mim do que dele, por não ter feito o que eu achava certo naquela hora, amaldiçoei cada momento semelhante que passei. Momentos em que nos sentimos totalmente atingidos, feridos e não conseguimos sequer expressar ares de descontentamento. Infelizmente, faltou culhão para dar a resposta.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Polêmica de cuecas

Domingo passado (10) uma reportagem estarreceu meu desânimo natural e típico do dia. A fantástica frase que abria a matéria de um certo night show era mais ou menos assim: “Polêmica, a babá pode usar a piscina do seu condomínio?”. Nem a emoldurada voz do Cid Moreira conseguiu acalmar minha abalada percepção.

Como assim, polêmica? Me parece que, ao estar sob o encargo exclusivo de tomar conta de uma (ou mais) criança (s), é intrínseco que uma babá acompanhe-a(s) em todas as suas atividades recreativas. Não consigo conceber que o preconceito e a síndrome-do-nariz-empinado cheguem ao ponto de barrar a entrada da empregada e, por conseqüência, da criança, numa área de lazer aberta a todo o condomínio.

“Ah, mas a babá não mora no prédio”, alegam os narizes empinados. Usam a norma como meio de proibição, ainda que erroneamente. Ora, aposto que as babás passam mais tempo nos condomínios de luxo do que as madames e os empresários que pagam os aluguéis ou possuem o imóvel. Feitos os trâmites legais e exames médicos, por que uma babá não poderia cuidar de uma criança na piscina? Estariam, então, os filhos da classe média alta proibidos dessa benesse por puro preconceito?

A reportagem me fez pensar que estamos à beira de um apartheid social. Assim, fica difícil ver alternativas plausíveis para uma nação tão controversa, mas que precisa, antes de tudo, de união.