segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Devaneios de um quase-jornalista (2)

Acordo às 6h15min, rigorosamente. Despertou o celular, já estou em pé. Ao menos, tentando ficar em pé. A sonolência desse período meio madrugada, meio manhã é uma verdadeira prova de resistência.

Vencido o primeiro obstáculo – estabilizar-se verticalmente – segue-se uma lista catalogada e criteriosa de pequenos feitos. Rotinas diárias tão minuciosas que, talvez, eu nem note sua passagem. O cereal com leite saboreado na tigela de louça azul que parece hermeticamente feita para tal função. A higiene comum a todos os seres humanos minimamente evoluídos. Aqueles breves minutos de pensamentos sobre como será o dia ou sobre como eu quero que ele seja. A escolha da roupa ideal para o clima e o humor da manhã e, finalmente, depois de arrumada a cama e borrifado o perfume, posso me despedir da minha toca.

7h10min, tenho um encontro marcado com o T9. Sei que ele sempre atrasa, por isso vou a passos lentos, apreciando os contornos do dia ainda fresco. Os funcionários do supermercado ao lado, como de costume, ainda esperam em fila indiana para começar o serviço. A lotação que busca alunos da Ulbra passa por mim no exato momento em que deve passar, quando ainda estou no começo da fatigante lomba que obstrui a chegada até o ônibus. Depois, a presença da mulher de sempre na parada anterior me anima. Mostra que não estou errado, que o mundo ainda não acabou. As coisas ainda estão em seu lugar. Ela está lá, seu ônibus não chegou. Claro, assim que piso, exausto, no ponto de ônibus, avisto do outro lado da rua as três mulheres que caminham sorridentes e conversadeiras em direção ao trabalho. Só falta agora mais uma coisa: a guria da carona. Ela, diferente dos outros mortais, não vai a pé até a parada. Ela sempre desce na frente, num Fox preto como os seus cabelos. Pronto! Agora está tudo em ordem, o ônibus já pode chegar. As rotinas já foram cumpridas. As três mulheres já chegaram ao trabalho. Eu já estou no transporte coletivo, felizmente vazio no início da manhã, e o pessoal do supermercado deve estar trabalhando. O pequeno ritual matutino está concluído. Ninguém quebrou sua religiosa participação nos fatos.

Mas as rotinas não são tão superficiais assim. São um complexo de pequenos elementos que tomam formas e feições com o passar dos dias. Aos poucos, nos damos conta de como somos iguais. Os mesmos, quase como nossos pais, como diria Elis Regina. Não me refiro à humanidade de uma maneira geral, mas a cada um consigo mesmo. As mudanças são lentas e graduais. Devem ser percebidas assim como as rotinas, com o suave e taciturno passar das horas.

7 comentários:

Luana Duarte Fuentefria disse...

Clicando em todos os blogs vizinhos, penso: "mas como essa gente estuda. Ninguém mais atualiza blog..."
Mas não! Entro no blog do Samir e, como sempre, está atualizado. E BEM atualizado.
Se puxando como sempre hein, seu Samir.

Anônimo disse...

taciturno?

Samir Oliveira disse...

Taciturno = calado, silencioso, tristonho, sombrio.

Liza Mello disse...

samir e seus textos longos sobre a rotina.. pra variar, bem escritos.

ah...ritual matutino?! samir neuróticooo!!! hehehe

Anônimo disse...

"... com o suave e taciturno passar das horas".
clap clap clap!

Rô Peixoto disse...

Nem sempre a rotina é notada... as vezes, só nos vemos no meio dela quando realmente paramos pra pensar sobre isso... Como qual parte do corpo lava primeiro, qual peça de roupa coloca primeiro, se coloca primeiro o café ou o leite, e todas essas coisinhas tão pequenas, que são "invisíveis"!

Um pouco de rotina é algo essencial para qualquer vida de pessoa normal! Mas o mais importante é quebrá-la de vez em quando, porque não há nada mais monótono do que uma rotina!!

Adorei!!

Carolina Tavaniello P. de Morais disse...

Acho que eu sou a única pessoa da turma que acorda as 10 para as 7. Todos acordam as 6 e pouco da madrugada. O que é isso?? Pooor favor, vamos dormir um pouquinho mais.

Sobre o texto, adorei todas as descrições. E eu também tenho uma rotina minuciosa, mas ela dura apenas 25 minutos.

Beijos