domingo, 23 de dezembro de 2007

Sobre tudo, menos camas e gatos


Os dois estão transando. A dança dos corpos é rítmica e envolvente como, de resto, é qualquer transa consentida. De repente, o armário se abre e saem dois garotos. A menina, amarrada e vendada, não percebe o movimento dos intrusos. O menino, morrendo de rir, é cúmplice.

Reconhece a cena? Longe – ou nem tanto - de ser um quadro dadaísta, a moldura acima retratada é um fragmento de “Cama de Gato”. O filme mais perturbador que meu modesto repertório já conheceu. Seguramente, o mais escabroso e delicioso de todos. Tanta repugnância junta chega a aliviar a alma. Lavá-la. Enfim, o mundo não é perfeito. Enfim, não há perseguições alucinadas nem efeitos especiais. A insanidade é crua e nojenta. Podre. Chula. Embutir esse conceito numa perspectiva de realidade é o que mais atormenta.

A insanidade apavora tanto por vir acompanhada da realidade, ambas revestidas pelo manto transparente da ficção. É isso que fez Sérgio Stockler ao dirigir o longa: travestiu essas duas inimigas numa obra sem igual que consegue debochar de toda a complexidade do mundo contemporâneo sem fazer rir. E, provavelmente, sem ter consumido muitos réis. Afinal, quanto é preciso para pagar o cachê de três jovens e alguns coadjuvantes, expor órgãos genitais a esmo e, ainda, um ânus que passa rápido (contraindo-se!) pelos olhos assustados como uma tentativa pútrida de mensagem subliminar? Esse valor, seja ele qual for, é o preço da realidade.

Mas o melhor vem depois. As opiniões débeis da juventude de classe média brasileira confirmam os inenarráveis conceitos do filme. Filme que, realmente, deixa uma marca no espectador. Um TRAUMA, que seja. Filme que deve ser visto e odiado por todos. Pois só a hipocrisia do ódio pode denotar o erro. Que erro? Não sei. Veja você e tente achar o seu.


Imagem: overmundo

9 comentários:

Liza Mello disse...

samiiir

volteeeei
e muito bom o texxxtoooo

hehe

adorei o "como, de resto, é qualquer transa consentida" hehe

Unknown disse...

"Pois só a hipocrisia do ódio pode denotar o erro."

Gostei dessa frase...

Luana Duarte Fuentefria disse...

Samiiiir! Eu te admiro cada dia mais e cada dia mais mooorro de inveja!

Agora até resenha fílmica (ou sabe-se lá como isso se chame) tu sabe fazer!

Ai, muito bom! Sem palavras! Tive até que ler duas vezes pra meu pequeno intelecto entender.

Tu disse tudo de uma forma tão ambígua e ao mesmo tempo tão direta, tão original e tão óbvia, tão sei-lá-o-que e tudo ao mesmo tempo!

Bah! Muito bom!

Carolina Tavaniello P. de Morais disse...

huuuum samir fazendo crítica de filme!! ui ui ui que chiqueeee

gostei, fiquei com vontade de ver o filme (essa é a tua intenção?)

beijo!!

Samir Oliveira disse...

ahaah.. Luana, que exagero! Só estás retribuindo o elogio que eu te dei, né? =P

Carol: sim, esse é meu objetivo ^^

Luana Duarte Fuentefria disse...

Não! É sério! É sério MESMO!

[bah, me transmite tua inspiração. to sem nenhuma...]

Anônimo disse...

samir, quando vi o filme - intencionalmente tosco, do ponto de vista técnico - fiquei perturbado, tocado, assim como tu sugeres que ficaste. mas o que mais me assombrou não foi exatamente a trama, a história dos garotões hedonistas que fazem de tudo por uma trepada e pelo prazer sem limites. o mais pérfido de tudo são os depoimentos dos jovens entrevistados pela equipe do filme, a parte que se poderia chamar de "não-ficção" - se é que há alguma narrativa neste mundo que possa ser chamada de realidade... no fundo, tudo é uma grande ficção, uma grande farsa, e esse filme só da ingredientes secos e verossímeis pra constatarmos - ou reafirmamos - que este mundo é caótico mesmo.

Anônimo disse...

" A dança dos corpos é rítmica e envolvente como, de resto, é qualquer transa consentida."
sim, a frase é bacana... mas mesmo transas consentidas podem ser desajeitadas. o que às vezes acaba por torná-las até engraçadinhas... :o)

Anônimo disse...

e aí? travaste?